A felicidade é o estado natural da alma. Ninguém nasce triste. Quando nascemos a alma parece-me bem, completa, de ciclo fechado. Aquela paz que um recém-nascido transmite é a de uma alma feliz, satisfeita.
A felicidade é a saúde da alma. Quando nascemos a alma parece leve, parece não precisar de nada (ao contrário do corpo, que depende totalmente dos outros) – ao recém-nascido basta-lhe ser.
À medida que nos vamos abrindo para o mundo (e nos vamos afastando de nós próprios) vamos fazendo escolhas e iniciando caminhos. Ninguém escolherá o mesmo caminho – o meio é diferente, os estímulos são diferentes, as circunstâncias são diferentes: a sua história será sempre única. É essa história que vamos construindo que nos empurra em direção a uma outra, e a outra, e a outra história. Haverão pessoas com caminhos idênticos, mas nunca iguais, sempre individuais.
Chega uma altura em que já temos história suficiente para olharmos para o que passou e reflectir. Chega uma altura em que vamos avaliar o que temos feito, o que andamos a fazer e o que queremos fazer. Vamos olhar para dentro. Quanto mais nos tivermos afastado da nossa verdadeira identidade, mais alto ela vai gritar dentro de nós. Ela vai reclamar aquilo que lhe é devido, aquilo que lhe tem sido retirado. A tristeza, o desconforto, o desalento são marcas visíveis da falta de saúde da alma – muitas vezes até a sentimos morta. Mas morta ela não está e se a sentimos sofrer é porque é urgente ouvi-la.
Ninguém pode receitar a felicidade a ninguém – cada um terá que saber por si próprio o que ela é para si. E não é difícil.
Muitas vezes sentia-me perdida, sentia que não estava a caminhar no sentido que devia. E sempre que me sentia assim, parava, ouvia, sofria e aguardava – se não sabia por onde ir, o melhor era aguardar. Nessas alturas imaginava-me no meio de quatro caminhos. Parava, sentava-me precisamente no meio deles e imaginava-me ali à espera. Atentamente à espera. Isto aconteceu muitas vezes.
Nessa altura, tudo na minha vida me parecia estar mal – o trabalho, o casamento, o meu dia-a-dia – tudo estava fora do sítio: eu estava fora do sítio – eu estava fora de mim. Muitas vezes procurei-me nos lugares errados, repeti os mesmos cenários. Até perceber que andava às voltas, regressando sempre ao mesmo lugar. Nesse lugar existiam sonhos, necessidades, medos, certezas. Nesse lugar estava a minha alma. Foram necessárias muitas voltas, muitas ilusões e desilusões para começar a dar ouvidos a esse lugar.
Quando, dentro do turbilhão, não conseguimos perceber o que queremos, devemos tentar prestar atenção àquilo que não queremos. O saber exactamente aquilo que não queremos pode levar-nos àquilo que mais queremos. “Quero isto?” – “não”. “Então vou por ali.”
Escutar a nossa voz, seja ela interior ou física, é um meio eficaz. Muitas vezes repetimos em voz alta as nossas verdades para os outros as ouvirem mas esquecemos de as ouvir também.
Eu, por exemplo, tive em tempos uma colega de trabalho muito fútil e trabalhar com ela era para mim um verdadeiro tormento. E eu repetia “não aguento mais, não aguento mais”. Imaginava-me a sair pela porta fora e nunca mais voltar – nesse pequeno momento a minha alma libertava-se um pouco, talvez, mas a realidade não mudava. O meu corpo continuava lá, a ouvir a tal colega. A minha voz cá dentro gritava e eu mandava-a calar. Fechava-a, no escuro, sozinha. Ao fim do dia, saía, aliviada, ia buscar o meu filho, seguia para casa, e o dia já tinha acabado sem eu ter visto um raio de sol. Poucas horas depois, tudo se repetia, por mais um dia.
A certa altura, nesse mesmo emprego, encontrei uma mulher a quem deixei escapar o meu sofrimento por trabalhar num lugar que me fazia sentir morta e ela, percebendo tudo, disse-me algo que nunca esqueci: ” é uma questão de amor-próprio”. E era. Mas levei algum tempo a perceber o que isso queria dizer. “Amor-próprio” não fazia parte do meu dia-a-dia naquela altura. Se o tivesse, não faria aquilo a mim mesma.
Alguns anos depois, já noutro emprego inadequado para mim, veio o desemprego. Caiu na minha vida como um meteorito, quando menos esperava. Agarrando em mim pelos braços, abanou certezas e deitou fora planos de vida que até aí eu achava estarem certos. Mas a verdade é que tudo o que caiu para fora de mim era lixo e só depois do desespero veio a paz.
este post tocou-me pessoalmente. Hei-de experimentar a técnica dos 4caminhos.
Obrigada:)
Bjs
Espero que essa paz te acompanhe sempre. Quem consegue ver o que (não) quer, no meio de um turbilhão de emoções, acontecimentos e mesmo a pressão exterior e encontra a paz, merece conservá-la!
muito obrigada por esta partilha!
eu estou a meio da fase que referes… e espero conseguir encontrar o meu caminho!
Tenho uma grande amiga que me avisa sempre: todas as mudanças são boas, mesmo que aches que não são!"
Gostei mesmo deste texto, porque espelha muito das minhas eternas dúvidas e dilemas, mas descrito duma forma simples e directa!
Ainda bem que conseguiste operar essa mudança!
Muito inspirador!
Concerteza que não… a vida não se muda sozinha. É importante olhar para dentro e seguir o caminho pessoal que a nossa essência determina. Assim é-se feliz!
Mais uma vez obrigada por partilhares.
Hesito muito entre pensar que ainda não encontrei o meu caminho e pensar que estou a ser ingrata com a vida por estar sempre insatisfeita.
O que faltará talvez seja mesmo ouvir-me a mim mesma, esse é um exercício a ser praticado sempre, em todos os momentos.
Gostei tanto de ler…
Ao ler isto…pensei que fosse a minha alma a falar…Obrigada pela partilha!
É bem verdade !
revejo-me nestas palavras. gostei muito do texto. vou fazer referência ao mesmo lá no meu blogue, se não te importares.
continuação de bom trabalho.
beijos
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Sinto-me aí no meio dessa viagem … cheia de duvidas, sem certeza de se o que não quero é apenas mero capricho ou é a minha alma realmente a gritar (cá dentro acredito que é a ultima, cá fora perco a força para a fazer valer) … estou na encruzilhada à procura do caminho. Espero encontrá-lo também um dia.
Descobri hoje o seu blog e estou a adorar. Sinto-me numa fase assim… Numa encruzilhada, sem saber bem aquilo que quero e que me faz feliz.
Gostei muito deste post. Obrigada pela partilha. Felicidades.
Tão bonito. Confesso que fiquei emocionada com tanta transparência de sentimentos e tantas verdades que me calaram fundo.
eu estou a passar algures por este texto… preciso de gostar mais de mim! obrigada pela partilha tão profunda!